Dr. Manuel Vaz Vieira
70 dos melhores
damistas nacionais marcaram presença no I Open Nacional de Ermesinde prova
pontuável para ranking Nacional.
Fotos ADP
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Terra sobejamente conhecida nos quatro cantos do nosso Portugal pelo seu
fervoroso entusiasmo pelo fenómeno damístico, Ermesinde acolheu no passado dia
16 de março um evento condizente com este seu sentimento pelo jogo das damas.
Falamos do I Open Nacional de Damas Clássicas “Cidade de Ermesinde”, prova
pontuável para o ranking nacional da Federação Portuguesa de Damas (FPD) da
época de 2013, e que contou com a presença de 70 damistas oriundos de vários
pontos do país, facto que desde logo coroou de êxito o recém nascido evento, o
que – naturalmente – muito deixou orgulhosos e satisfeitos os seus
organizadores, que prontamente apalavraram uma segunda edição em 2014. Mas já
lá vamos.
Organizado pelo Núcleo de Damas de
Ermesinde/Café Avenida – o grande veículo do nome da nossa freguesia no mundo
das damas – com o auxílio da FPD, da Associação de Damas do Porto, e da Junta
de Freguesia de Ermesinde (JFE), o evento teve como palco o polivalente da
Escola Secundária local, onde durante a tarde do citado 16 de março evoluíram
sete dezenas de damistas, alguns dos quais nomes consagrados da modalidade,
facto que trouxe ainda mais brilho àcompetição. Geograficamente
falando Ermesinde recebeu jogadores/equipas oriundo(a)s de Mangualde, Viseu,
Vizela, Gondomar, Valadares, Vila do Conde, Lobão, Coimbra, Aveiro, Santo
Tirso, S. Pedro da Cova, ou São João da Madeira.
Paralelamente ao torneio oficial o
Núcleo de Damas de Ermesinde/Café Avenida organizou uma outra competição –
amigável – destinada a jovens com menos de 16 anos, na qual participaram oito
promissores damistas, que além de terem desfrutado de uma série de jogos entre
si puderam aprender com alguns dos melhores mestres nacionais, como por exemplo
Vaz Vieira, e a grande estrela deste I Open Nacional de Damas Clássicas. Sem
grande surpresa Vaz Vieira enriqueceu ainda mais o seu invejável – no bom
sentido, claro está – palmarés, ao sagrar-se vencedor deste torneio. Quanto ao clube da
casa, colocou em ação cinco damistas, tendo Nélson Monteiro obtido a melhor
classificação, um décimo lugar, enquanto que os seus companheiros de equipa
Manuel Silva, Sérgio Bonifácio, José Rocha, e Ricardo Araújo, foram
respetivamente 14º, 15º, 20º, e 39º.
Ainda antes da cerimónia final, a qual contou com a presença do presidente
da JFE, Luís Ramalho, e de um elemento ligado à direção da Escola Secundária de
Ermesinde, neste caso Ana Maria Cortez, o nosso jornal trocou breves palavras
com Jorge Rocha, um dos elementos da organização, que em jeito de balanço
vincou então a satisfação e orgulho consequentes de tudo ter corrido... para lá
do esperado. «Em Portugal existem opens que reúnem em média cerca de 50
damistas, aqui tivemos 70 (!), entre eles sete
mestres nacionais, onde se destaca naturalmente o “doutor” Vaz Vieira, o melhor
jogador português de todos os tempos. O sucesso deste I Open Nacional de Damas
Clássicas “Cidade de Ermesinde” é a prova de que a nossa terra continua a ter
uma tradição damística muito grande, é uma “universidade” das damas, que ao
longo dos anos foi formando campeões, conquistando inúmeros títulos (coletivos
e individuais), mas que por falta de algum dinamismo tem estado um pouco
apagada, e passado ao lado da nossa sociedade civil. Entendemos por isso que
pela primeira vez devíamos colocar o nosso nome no panorama desportivo da
modalidade, e convidamos então muitos damistas, e com a importante contribuição
da JFE conseguimos um evento que no número de pessoas é já o segundo maior do
país! Queremos que isto funcione como um ponto de partida, de modo a que este
desporto tão nobre e intelectual continue a dignificar o nome de Ermesinde como
o tem feito ao longo dos últimos 30 anos pela mão do Núcleo de Damas de
Ermesinde/Café Avenida», sublinhou.
Jorge Rocha mostrou-se ainda muito feliz
pela “boa jogada” da organização em levar a cabo um torneio paralelo destinado
a damistas com menos de 16 anos, um evento inovador em Portugal, que segundo o
nosso interlocutor serviu como uma garantia de que o futuro da modalidade quer
na nossa cidade quer no restante país tem pernas para andar.
HOMENAGEM AO MAIOR DAMISTA
PORTUGUÊS DE TODOS OS TEMPOS
No mundo das damas é tratado por “doutor”, uma designação que o próprio
desconhece a razão de existir, mas que ao olharmos de relance para o seu rico e
extenso palmarés se fica facilmente a perceber o porquê da atribuição de um
título tão pomposo. Vaz Vieira, ou melhor, “doutor” Vaz Vieira, assim é que é,
considerado de forma unânime no “planeta” das damas como o melhor jogador
português de todos os tempos, e que na nossa freguesia foi alvo de uma sentida
homenagem que constituiu o ponto alto deste I Open Nacional de Damas Clássicas
“Cidade de Ermesinde”. Como já referimos ele foi um dos 70 damistas presentes,
e sem surpresa venceu a competição, com a classe e simplicidade do costume. No
seguimento de uma pequena entrevista concedida ao nosso jornal ficamos a
conhecer um pouco melhor esta lenda – já ganhou esse estatuto – das damas
nascido há 69 anos em Guimarães, mas que de há umas décadas a esta parte faz de
Coimbra o seu lar.
Admirado e respeitado por todos os seus
companheiros de modalidade ele começou por agradecer o convite endereçado pelo
seu amigo Sérgio Bonifácio – jogador do Núcleo de Damas de Ermesinde/Café
Avenida – para vir até à nossa cidade participar neste primeiro evento dedicado
à modalidade. «Agradeço-lhe o convite, ele, que além de um grande amigo, é um
profundo entusiasta das damas, e um dos mentores deste torneio, que espero que
sirva para dinamizar a modalidade nesta cidade. Aliás, a minha vinda aqui
também foi no sentido de contribuir para essa dinamização. Vou ser também
homenageado, o que para mim é um motivo de orgulho, orgulho e felicidade em
sentir o apreço das gentes de Ermesinde, a quem deixo aqui o meu muito
obrigado», expressou com alguma emoção o grande mestre das damas lusitano.
No desfiar da nossa conversa recordou o
passado, o seu passado glorioso ao serviço de uma modalidade pela qual se
apaixonou ainda menino, numa altura em que os lares portugueses estavam ainda
despidos das novas tecnologias – com a televisão e os computadores à cabeça – e
como tal os serões em família eram passados com a saudável e alegre disputa de
jogos tradicionais, como o rami, o abafa, o xadrez, ou as damas. «O meu pai
gostava muito de jogar às damas, era aliás um grande jogador, e foi com ele que
comecei a jogar. Recordo que chegava a chorar sempre que ele me vencia e depois
me espicaçava com o seu triunfo. Como em tudo na vida sou persistente, e fui
aprimorando o meu jogo, e chegou uma altura em que ele já não me ganhava»,
relembra o “doutor” das damas com um sorriso nostálgico no rosto.
Ainda deambulando pelo passado viajou
até Moçambique, onde viveu grande parte da infância, junto dos seus
progenitores, e onde vivenciou outra paixão desportiva, o futebol. Ao serviço
do Benfica de Lourenço Marques foi mesmo campeão provincial, tendo mais tarde
aquando da sua vinda para a metrópole integrado a equipa de juvenis da
Académica de Coimbra, onde foi treinado pelo lendário “mestre” José Maria
Pedroto. Por Coimbra ficou. Estudou na mítica universidade da cidade do
Mondego, a mesma universidade onde desenvolveu a sua carreira de docente, e
orientador de estágios. Em Coimbra casou, sem nunca esquecer a paixão de
infância pelas damas, aliada à paixão entretanto travada com a Académica, pois
«quem é que passa pela academia e não fica adepto da Briosa?», questiona Vaz
Vieira.
Nas damas tornou-se então o campeão dos
campeões. Ao longo de décadas somou títulos atrás de títulos. Venceu 10
campeonatos nacionais seguidos, ao que se seguiu uma paragem de outra dezena de
anos por motivos de saúde, e quando voltou novamente à ação foi de novo
campeão! Detém um impressionante registo de 86 vitórias em opens nacionais,
número que nenhum outro damista se atreveu sequer a ameaçar. No plano
associativo foi um dos fundadores da Federação Portuguesa de Damas, em 1980, onde
hoje assume a função de presidente da mesa da Assembleia Geral. Do seu
currículo constam ainda dois pomposos títulos de campeão do Mundo de damas
clássicas, e muitos outros títulos conquistados em épocas em que a FPD ainda
não havia visto a luz do dia. Impressionante, de facto. O segredo deste
sucesso? «É o trabalho, aliado ao gosto pela modalidade, de jogar somente pelo
prazer, pelo prazer de jogar e não jogar pelo prazer de ganhar, que é uma das
coisas que eu crítico».
Para si as damas são um desporto de
grande beleza, «poucos jogos haverá com a beleza deste jogo, que nos
proporciona combinações fantásticas, um jogo onde se podem construir problemas
com muito poucas peças, e problemas com muitas pedras e com dificuldade
extrema». O fim da carreira ainda bem longe, pois continua enamorado por este
jogo, deixando os títulos e as vitórias de lado, até porque há muito que já não
é isso que o motiva a continuar.
Como grande mestre da modalidade viu com
bons olhos a edificação de um torneio de jovens neste I Open de Damas Clássicas
“Cidade de Ermesinde”, pois os jovens são o futuro, «e pena é que este tipo de
iniciativas não se repita mais vezes noutros torneios nacionais. Hoje as “ruas”
dos jovens são múltiplas, são os jogos de computador, os concertos, as playstaions,
um sem número de atividades que os desviam deste tipo de modalidades, como
xadrez e as damas, modalidades que neste momento estão em “banho maria” à
espera que haja sangue novo. Mas isso só pode ser conseguido se houver uma
aposta séria no desporto escolar, algo que neste momento não se faz em
Portugal», desabafa o “doutor” Vaz Vieira pouco antes de receber das mãos do
presidente da JFE, Luís Ramalho, a placa de homenagem com que foi brindado pelo
Núcleo de Damas de Ermesinde/Café Avenida.
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